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A MODA DOS CONGRESSOS: Jardins, flores e utopia

[img]https://www.portaldojardim.com/artigos/empresas/congressos070507/abertura.jpg[/img] 

[i]Texto: José Eduardo Franco, Historiador
Foto: Portal do Jardim[/i]

Os congressos estão definitivamente em moda. Fazem-se congressos sobre tudo e mais alguma coisa. Desde assuntos médicos passando por questões de história ou até sobre flores e jardins. O próprio autor que vos escreve estas reflexões tem promovido aquela forma de reunião para debater, aprofundar e actualizar conhecimentos. Por exemplo, estamos agora a preparar um congresso internacional sobre os “Jardins do Mundo”, que terá lugar na Ilha da Madeira no próximo mês de Maio, dias 9 a 12, no Centro de Congressos da Madeira sediado no Casino Park Hotel do Funchal. E porque não partilhar o estudo das flores, dos resumos da natureza, dos espaços miniaturizados de beleza e de harmonia natural que são os jardins, quais concretizações domésticas, num pequeno recinto, dos nossos sonhos utópicos de harmonia entre o homem e natureza. Quem não sonha ter uma casa com um jardim, ou se já tem, com jardim fantástico.

O jardim é de facto o microcosmo, a construção ideal do bem e da perfeição, o lugar do silêncio e da contemplação, e ao mesmo tempo o espaço da alegria e da descontracção. O arquetipismo do jardim remete-nos para uma simbologia agregadora, de unificação, de regresso, de recuperação e também de finalidade utópica. Não deixa, por isso, de ser significativo que um dos projectos arquitectónicos ganhadores do concurso para substituir o World Trade Center destruído pelo atentado de 11 de Setembro de 2001 em Nova Iorque, da autoria do arquitecto polaco Daniel Libeskin se chame precisamente “World Trade Center Gardens of the World”. Perante a consciência traumática, de desagregação, de factura, que representou a destruição provocado pelo atentado, o tema do jardim é evocado arquitectonicamente como possibilidade simbólica de recuperação do ideal de unidade e de harmonia e paz pedido.

Os congressos de que falamos são, todavia, uma criação recente em termos históricos, contando menos dois séculos. O termo vem do latim congressus, cuja raiz etimológica congredi significa conferenciar, encontrar-se para conversar. Era uma palavra usada para dizer uma reunião de várias pessoas com o fim de debater e resolver algum problema ou negócio.

O vocábulo “Congresso” vulgarizou-se, na ordem política, para significar uma reunião normalmente realizada para tratar de assuntos governativos, particularmente a concertação de entendimentos entre nações. Na ordem canónica, concílios e capítulos de Congregações configuram-se como assembleias congressistas com tradição tão antiga quanto o cristianismo. Recorde-se o primeiro Concílio de Jerusalém relatado pelos Actos dos Apóstolos, onde S. Paulo conseguiu persuadir os discípulos de Jesus a abrir a pregação do Evangelho aos gentios quebrando a exclusividade da sua proclamação apenas aos Judeus.

Na história contemporânea, a tradição dos congressos, com o modelo mais parecido ao de hoje, surge na Áustria, tendo como mentor o ministro Clemente Metternic, o qual planeou o primeiro congresso assim chamado para tentar resolver diplomaticamente os conflitos que dividiam a França napoleónica e o resto da Europa. Esse Congresso, depois de ter sido agendado para Praga, acabou realizar-se em Viena de Áustria em 1814. No entanto, aquele encontro ficou conhecido como “congresso dançante”, pois dançou-se mais em belas festas de salão do que se resolveu os problemas em debate, não se conseguindo a médio prazo a desejada pacificação da Europa.

Na verdade, só depois de meados do século XIX, os congressos, com o modelo de Matternich, vieram a ganhar forma cultural e se afirmaram como prática recorrente, alguns deles com grande projecção mediática (vide congressos partidários). De dimensões várias em termos de abrangência (regional, nacional, internacional e mundial), passaram a organizar-se congressos de diversos tipos e para todos os gostos, sensibilidades e tendências ideológicas: políticos, ideológicos, religiosos, científicos, sociais, sindicais, etc. Os congressos tornaram-se lugar de encontro, de debate de ideias, de partilha de conhecimentos e de propostas de acção, de mobilização, de formação, de manifestação de militância, de conhecimento pessoal, mas também de confraternização, condimentados com banquetes, bailes, sessões solenes, recepções, visitas de estudo, passeios, procissões, desfiles, exposições, etc. De facto, esta forma de reunião impôs-se não só como evento cultural, mas ainda como acontecimento social. Passou até a obrigar a vestuário adequado, ao incómodo da deslocação de uma terra com investimento em viagens, a estadias organizadas, à exposição pública. Uma oportunidade para muitos autores e figuras da sociedade, da políticas e da cultura serem conhecidas e interpeladas pessoalmente. Portanto, o congresso tornou-se um autêntico lugar de epifania, de revelação e, de algum modo, uma espécie de ritual social de passagem, de prova ou de consagração pública.

De certo modo, o congresso acaba por uma síntese de um ideal de partilha de conhecimento, uma antecipação concentrada de uma utopia de encontro. Em 3 ou 4 dias ensaia-se num congresso uma mini-universidade, uma experiência de transmissão e troca de saberes com ambição totalizante em torno de determinado tema e assunto. Possam de facto os congressos de hoje unir em vez de separar e combater o individualismo e indiferentismo desagregador da nossa sociedade que tende a ficar ensimesmada e fechada em casa.

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